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Valor Econômico: Comissão da Verdade convocará empresários entre 1º e 2º turnos

Por Auris Sousa | 11 set 2014

A CNV (Comissão Nacional da Verdade) deverá anunciar a convocação de grandes empresas para prestar esclarecimentos sobre a colaboração com o regime militar (1964-1985) entre o fim deste mês e o início de outubro, segundo anunciou esta segunda a coordenadora do grupo, Rosa Cardoso. A informação foi publicada nesta quinta-feira, 11, pelo jornal Valor Econômico. 

A convocação irá coincidir com a reta final da campanha eleitoral este ano, onde os apoiadores das candidaturas presidenciais de Dilma Rousseff (PT), Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB) disputam financiadores. Os integrantes da comissão se apressam porque correm contra o tempo: os trabalhos do grupo precisam ser encerrados este ano. 

Para o Valor, Rosa Cardoso informou que a CNV deve concluir nos próximos dias a análise de documentos que envolvem 39 empresas e que mostram indícios de colaboração. Uma das peças mais importantes é uma relação feita pelo Dops (Departamento de Ordem Política e Social) de São Paulo em janeiro de 1981, com o nome de 460 sindicalistas a serem monitorados. 

Os sindicalistas atuaram na greve declarada ilegal em 1980, que afetou principalmente a região do ABC. Eles estão divididos por empresas, com o endereço residencial. Manuscritas a lápis, há varias anotações sobre em que seção os profissionais trabalhavam em cada empresa. O entendimento dos integrantes da CNV é que seria altamente improvável o Dops conseguir as informações sem a colaboração direta dos departamentos de pessoal de cada empresa. 

Há evidências de que o fornecimento de informações de empresas ao Dops era usual. Um outro documento analisado pela CNV, de 1978, comprova que a indústria de autopeças Resil enviou fichas cadastrais de empregados para o Dops, depois de identificar os mentores de um movimento grevista por meio de infiltrados em reuniões sindicais. Procurada pelo Valor, a Resil não se manifestou. 

A CNV irá verificar se algum integrante da lista foi vítima de crime de lesa-humanidade, imprescritível de acordo com convenções internacionais assinadas pelo Brasil. Podem se enquadrar nesta categoria, de acordo com Rosa Cardoso, o assassinato, a tortura, o desaparecimento e a detenção fora de estabelecimentos oficiais. Caso crimes desta natureza tenham acontecido em 1981, eles não estão cobertos pela lei de anistia sancionada pelo governo Figueiredo em 1979. “O trabalho da CNV poderá servir de base para processos de reparação de danos morais e econômicos”, disse Rosa Cardoso. 

No relatório final da CNV, há outros casos em análise, inclusive do período anterior ao regime militar. O mais antigo envolve a Mineração Morro Velho, em Nova Lima (MG), que teria denunciado 51 funcionários em 1949.

Como inspiração para orientar eventuais processos contra empresas, a CNV recebeu a visita da pesquisadora Victoria Basualdo, do Cels, ONG argentina que atuou em diversos processos contra o regime militar que vigorou entre 1976 e 1983 naquele país. Basualdo expôs aos brasileiros o único caso de condenação civil de uma empresa argentina por violação de direitos humanos. 

Aconteceu em 2012, contra a Siderca, uma subsidiária do grupo siderúrgico Techint, onde um funcionário foi sequestrado em 1977 e seu cadáver está desaparecido desde então. A viúva do funcionário ingressou com ação indenizatória pela lei de acidentes de trabalho. A Techint está recorrendo alegando que o crime prescreveu.

Entre os trabalhadores de empresas que estavam sendo monitorados na lista do Dops, estavam empregados de várias empresas de metalurgia, autopeças, eletrodomésticos e montadoras instaladas em São Paulo à época: Volkswagen, Toyota, Chrysler, Ford e Scania. 

Procurada pelo Valor, a Volkswagen divulgou uma nota oficial nos seguintes termos: ” A Volkswagen investigará qualquer indicação de uma eventual participação de funcionários no fornecimento de informações ao regime militar no país. A Volkswagen é reconhecida como um modelo por tratar seriamente a sua história corporativa. A empresa irá lidar com este assunto da mesma forma. A Comissão Nacional da Verdade não contatou ainda a Volkswagen sobre esse assunto”. Há 42 empregados da empresa na lista do Dops de 1981. 

A Volkswagen também é citada em outro documento analisado pela CNV, produzido pelo Centro de Inteligência da Aeronáutica (Cisa) em 1983. Um grupo de 18 empresas foi reunido nas dependências do Grupo Villares pelo Comando da Aeronáutica em São José dos Campos (SP) para trocar informações sobre as atividades políticas e sindicais de seus funcionários. O documento da Aeronáutica frisa que o representante da Volkswagen “expôs os assuntos mais importantes”. 

Entre essas informações, há relatos sem qualquer conexão com a empresa, como o de uma assembleia em que o então presidente do PT Luiz Inácio Lula da Silva, futuro presidente da república, sugeria a mutuários do extinto Banco Nacional de Habitação a sacarem dinheiro das cadernetas de poupança. 

Com cinco empregados na lista feita pelo Dops, a Toyota afirmou em nota “que não possui qualquer registro ou evidências relacionadas às questões levantadas”. A Mercedes-Benz afirmou em nota que “o respeito e a preservação dos direitos humanos são de grande importância” para a empresa, que estaria pronta ” para apoiar as autoridades a esclarecer o assunto no que for necessário”. Para isso, a Mercedes já teria começado investigações internas, de acordo com a assessoria de imprensa da montadora. Constam 45 empregados da Mercedes na relação feita pelo Dops. 

A Fiat, atual proprietária da Chrysler, disse em nota que não pode responder por iniciativas da empresa de origem norte-americana tomadas naquele período. Há 19 empregados da Chrysler na lista. 

A montadora Scania afirmou em nota que ” não recebeu qualquer comunicado ou tomou conhecimento sobre quaisquer documentos relativos ao assunto tratado pela Comissão. A montadora sueca ressaltou que “opera em mais de 100 países no mundo sob rigoroso código de ética”. Na lista do Dops, há 17 funcionários da empresa. [Fonte: Valor Econômico]

Jornal Visão Trabalhista EDIÇÃO #11